segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Educação – trabalho: abordagens sociológicas

Analisemos, algumas teorias sociológicas sobre o emprego/trabalho que nos poderão dar pistas sobre as várias perspectivas em causa, variando no tempo e no espaço, e ajudar-nos a analisar criticamente as diversas propostas.
Durkheim, numa perspectiva clássica e, de certo modo, fundadora, realçou as relações educação - trabalho e entre as vias de estudo os papéis ocupacionais ou profissões, acentuando o papel da educação, quer como socialização (moral), quer como qualificação (técnica) para o trabalho. Estes dois aspectos são inseparáveis, na medida em que integram o indivíduo no sistema político-ideológico dominante e no mundo da produção (reprodução social).
Esta perspectiva parece ser demasiado funcionalista e consensualista, na medida em que, relacionando de forma directa e imediata, o trabalho e a educação, abstraindo dos processos sociais internos à estruturação dos saberes educativos, como a escolarização dos saberes e dos “fazeres”, esquecendo, ainda, as correlações de forças entre os diversos actores ou as próprias lutas entre eles.
Nos anos sessenta, duas teorias emergem: na economia, a de Becker e a de Schultz, na análise do capital humano; na sociologia, a teoria técnico-funcional da educação que, basicamente, defende uma estratificação social (os lugares ocupacionais são adquiridos através da educação escolar). Há uma ligação directa e imediata entre as aprendizagens do sistema de ensino e as habilidades e qualidades no exercício do trabalho. Digamos que o diploma garante e exige a competência. Como em Durkheim, esquecem-se os processos sociais que organizam os mercados de trabalho. A perspectiva é individualista (um diploma, uma competência), esquecendo-se os colectivos de trabalho ou o carácter colectivo das relações de trabalho.
A teoria do capital humano relaciona-se com a técnico-funcional, apesar de ter uma origem disciplinar diferente ( aquela, da economia; esta, da sociologia), na medida em que faz, também, articulações directas entre os sistemas produtivos e os sistemas de ensino.
Randall Collins, nos anos setenta, propôs uma alternativa, criticando a teoria técnico-profissional da educação e a do capital humano, valorizando a luta política e concorrencial por “bens raros, prestigiantes e compensadores” (o que, em termos simples, poderemos dizer:”a corrida aos melhores lugares”). Interessa o poder, a riqueza, o prestígio. As escolas, neste aspecto, ensinam “culturas de estatuto”, em que pertencer à escola ou à universidade x, corresponderá uma garantia de emprego de qualidade ou de estatuto superior, embora com o alargamento da escolarização esta cultura do estatuto tenda a diminuir.
Apesar de tudo, o autor conclui que, quando escrevia, tinha em conta que, para o exercício do trabalho nas sociedades industrializadas, era suficiente o nível elementar de escolarização, tendo, mais tarde, concluído, a relação educação - trabalho “é definida em cada momento e para cada caso considerado”. Apesar de tudo, foi criticado por não ter valorizado a inovação tecnológica na complexidade do exercício do trabalho e, ainda, que os empregadores podem modificar as formas de recrutamento e fazer variar este modelo credencialista que parecia “credencializar” automaticamente para determinada função.

A Teria da Correspondência foi desenvolvida por Bowles & Gintis e valoriza a função económica da educação e as relações sociais que “estruturam a experiência educativa dos estudantes”. Numa perspectiva marxista ou próxima do marxismo, esta teoria defende que as escolas “legitimam as divisões de classe” e produzem a força de trabalho necessária à manutenção do sistema capitalista. Há, assim, uma correspondência entre a escola e o trabalho e dai o nome desta teoria.
Nesta perspectiva, embora mais centrada nos EUA, a educação exerce um dos papéis mais activos na reprodução social. Esta relação de correspondência manifesta-se na autoridade (há uma hierarquia a que se deve obedecer e que é interiorizada), e, ainda, na relação dos sujeitos com a actividade que exercem e com os outros indivíduos. Esta hierarquia ocupacional é diversa e contraditória, criando “subjectividades inconformadas e inconformistas”, o que é visível nos conflitos surgidos quer entre alunos, quer entre trabalhadores. Mas esta complexidade varia com a sociedade: uma sociedade mais complexa cria mais contradições.
Esta teoria da correspondência também tem os seus críticos, como, por exemplo, Morrow & Torres que a consideram insuficiente e pouco clara, uma vez que esquece que o sistema educativo tem especificidades próprias e, só por si, é capaz de produzir, reproduzir e distribuir conhecimentos, não funcionando apenas de um modo unilateral (educação → produção). Para além da economia, há outras esferas a ter em conta, como os contextos do Estado e da produção capitalista. A escola tem um funcionamento dual, na medida em que se organiza segundo os direitos humanos e os princípios da cidadania (transformação social), ao mesmo tempo que ajuda a reprodução social, isto é, a manutenção das classes e da divisão do trabalho.
Em resumo, digamos que enquanto a teoria da correspondência educação – trabalho acentua as dimensões económicas e, portanto, de reprodução social, a perspectiva de Morrow & Torres foca os processos diversos, no tempo e no espaço, que explicam as contradições ou conflitos existentes no sistema capitalista.