terça-feira, 22 de junho de 2010

MULTICULTURALISMO E EDUCAÇÃO

Qualquer trabalho em situação multicultural deve partir de uma base simples: as culturas minoritárias são um enriquecimento para o conjunto dos cidadãos e nunca um travão para a unidade nacional, como supõem as mentalidades racistas ou pró-racistas. Segundo a teoria do multiculturalismo, as expressões culturais das minorias devem ser encorajadas e as crianças e os jovens imigrantes sentir-se-ão melhor se o ambiente que os rodeia for propício à expressão ou manifestação das diferenças culturais. Digamos que esta prática multicultural funciona como um “mosaico cultural”, mais do que como o “melting pot” americano, no sentido de caldo de culturas ou mistura de raças.
As práticas multiculturais podem ser diversas, conforme a perspectiva que tivermos do multiculturalismo, acentuando mais uma ou outra vertente. Se tivermos uma visão mais passiva, considerando o multiculturalismo como a coexistência, apenas, de outras culturas no seio do nosso país, caminharemos mais para um “deixar andar”, entregando-as a si mesmas, como se não fosse nada connosco. Mas, se tivermos uma perspectiva mais voluntarista, tomaremos posições anti-discriminatórias, lutando por conseguir um estatuto igual para os membros das diferentes culturas ou posições mais identitárias, favorecendo a expressão das particularidades das diversas culturas, ou posições mais comunitaristas, permitindo a existência de estatutos legais e administrativos específicos para os membros de qualquer uma comunidade cultural.
A prática multicultural, visando uma integração não subordinada passa por vários caminhos, podendo nós apontar alguns exemplos:
- As bibliotecas terem uma quantidade razoável de livros escritos nas línguas minoritárias;
- Encorajar as crianças das minorias étnicas a utilizarem duas línguas, a materna e a do país onde vivem;
- Festejar nas escolas, nos bairros residenciais ou nos locais onde vivem (bairros, aldeias ou cidades) as festas das diferentes comunidades étnicas;
- Organizar festivais de música, dança, ou outras práticas culturais;
- Ter informações para os pais disponíveis nas diferentes línguas, segundo a composição étnica e cultural do bairro;
- Fazer estatísticas sobre a origem étnica da população – com ou sem a identificação religiosa – com o objectivo de melhor compreender as evoluções sociológicas para formular as políticas públicas adaptadas.

Estas práticas visarão a construção de contextos sociais e educativos menos desigualitários.

Sabemos que os partidos da chamada direita, com os seus medos históricos e as suas tendências excessivamente securitárias, mesmo uma certa esquerda moderada e os próprios média, encorajam a recusa de qualquer integração, em nome de um ataque à unidade nacional. Ao multiculturalismo opõem uma certa noção de “portugalidade”, entendendo por isso uma pertença ao país, aliada a um bom conhecimento da sua história e a um respeito pelas suas tradições. Estas pessoas opõem-se, por vezes, não só às políticas públicas baseadas no multiculturalismo, mas também à prática das línguas maternas pelas famílias originárias de outros países. Para não falarmos na proibição total da prática das culturas de origem e na obrigação de um ensino eurocêntrico da história. Uma certa esquerda radical desvaloriza a diversidade cultural, apelidando-a de meramente simbólica, e acentuando, apenas, as múltiplas discriminações que existem em matéria de emprego, de alojamento e de educação ou cuidados de saúde. Apelidam mesmo estas posições como uma defesa crítica do multiculturalismo.
O “melting pot” americano baseia-se sempre no “patriotismo” e “identidade” americanos, favorecendo a superioridade de alguns, não impedindo a formação de movimentos comunitários, designando sempre os seus cidadãos pela sua origem étnica: luso-americano (para o português), ítalo-americano (para o italiano), sino-americano (para o chinês), afro-americano (para os negros), irlando-americano (para os irlandeses), etc.
Se quisermos ter um conhecimento/tradução/interpretação das culturas, teremos de ter quadros de animadores culturais e outros técnicos especializados oriundos ou não do mesmo grupo étnico. A formação de quadros é importante, desde os professores de língua ou dança, por exemplo, até ao médico ou ao técnico de saúde que sejam falantes da língua materna e saibam transmitir à comunidade os cuidados primários ou preventivos a ter nesta área. Um exemplo simples: um médico caboverdiano, falando crioulo, estará sempre mais próximo das comunidades caboverdianas e as suas palavras ou mera presença serão mais eficazes na educação sanitária, sobretudo em assuntos que permanecem tabus, como a educação sexual, a sida, a gravidez precoce ou, mesmo, a tuberculose, por acarretarem consigo cargas simbólicas negativas no interior da comunidade.
A consciencialização da diferença e do direito à diferença (“Todos iguais, todos diferentes!”) é um caminho multicultural necessário, supondo o respeito pelo outro, a abolição de quaisquer formas de racismo e o desenvolvimento de capacidades que façam as minorias étnicas sentirem-se bem e orgulhosas de si e da sua cultura.

Sem comentários:

Enviar um comentário